André Novaes: Uma voz que encanta

Como cantor lírico André já participou de várias óperas, recitais e apresentações importantes no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, Sala Cecília Meireles, Igreja da Candelária.

ENTREVISTAS

1/21/20255 min read

O cantor lírico André Novaes é uma dessas pessoas fascinantes. Dono de uma voz profunda e refinada que toca a alma de quem tem a satisfação de apreciar a boa música que este artista produz. Sua versatilidade artística o permite explorar um amplo repertório, desde a grandiosidade da ópera até a intimidade do lieder e da chanson, sem abrir mão da música popular. Com um profundo conhecimento sobre a música, André, também é professor de percepção musical, prática de conjunto e teoria musical na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e integrante do grupo Viver com Yiddish, que reproduz músicas de uma antiga língua falada por judeus.

Como cantor lírico André já participou de várias óperas, recitais e apresentações importantes no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, Sala Cecília Meireles, Igreja da Candelária. Atualmente o artista tem vislumbrado expandir sua música para o grande público, numa seleção de canções populares de temas de novelas e grandes sucessos do rádio. “Estou trabalhando num projeto que associe música lírica para o grande público. Meu desejo é continuar as apresentações nos teatros, mas poder levar a minha música para as pessoas comuns ouvirem. Muitas canções as pessoas conhecem, mas não tem a oportunidade de estar em contato com o cantor. Quero levar a música de qualidade a vários tipos de eventos, sejam empresariais ou particulares.” - revelou.

A música chegou na vida do tenor André Novaes na infância e já lhe deu a certeza de qual carreira seguir. Assim, o filho do seu Francisco e da dona Maria das Dores viu uma oportunidade de sonhar, se tornar um artista e viver da arte. Mas engana-se quem pensa que foi um processo fácil, não obstante, como uma pessoa muito positiva, o musicista viaja pela própria trajetória como alguém que venceu todos os obstáculos ao poder viver daquilo que acredita. Inclusive ao fazer questão de falar sobre a sexualidade dele, não apenas como posicionamento, mas como militância. “Comecei com a música bem cedo aos 6 anos de idade em um projeto social no meu bairro em Volta Redonda. A música em Volta Redonda era uma coisa muito forte, quase todas as escolas públicas têm o ensino musical. Os meus pais tem de uma educação básica e o que achei legal foi que mesmo eles não me impulsionado, eles também nunca me impediram de viver meu sonho. Meus pais não tinham uma visão da música poder ser uma profissão, de como eu poderia viver da música e mudar a minha vida, assim como mudou. Mas eles me apoiaram da maneira deles, não impedindo que eu sonhasse. Eu escolhi a música desde cedo e sempre me dediquei muito e fui agarrando as oportunidades que apareciam” - relembrou o cantor.

Música Yiddish como resistência

O músico e professor André Novaes explora todas as nuances das canções que interpreta com muita autenticidade, emoção, transmitindo ao público os sentimentos da obra musical. Neste processo de alta performance como cantor lírico, o artista iniciou seus estudos na UFRJ, em 2013, ainda como estudante de trompete, formação que logo deu lugar ao canto e ao piano. Desde a entrada na universidade, André não saiu mais, tornando-se professor do Curso de Extensão. Nesta vivência na tradicional “Casa da Música” passou a integrar o grupo Viver com Yiddish, no qual André foi convidado para cantar pela diretora da Extensão, Aline Silveira, que é uma das integrantes da banda e toca piano. Ele também leciona a língua Yiddish para descendentes de judeus no Rio, na Barra da Tijuca - Engenho das Artes, Espaço Tápias, com um grande coral infanto/juvenil.

O idioma tem a fusão de três línguas: alemão, hebraico e línguas eslavas. Formou-se há mais de mil anos, com a intensa migração de judeus que fugiam das perseguições que sofriam na Península Ibérica e na França para a Europa Central e Leste Europeu, e que foram chamados de ashkenazim. “A música Yiddish fala muito dos percalços desse povo. Dos filhos indo embora do país e nunca mais às famílias se encontrarem. Eles viam muito a música com um lugar para colocar seus lamentos e também uma mensagem de alento de tentar ter esperança, ter conforto naquilo que você tem de alguma maneira.” analisou o cantor falando sobre os sentimentos de críticas que a guerra entre Israel/ Palestina/Líbia lhe traz. “As pessoas ainda não aprenderam a viver em paz, elas acham que para que eu viva bem é preciso que você não tenha nada. O mundo tem alimento para todo mundo, tem trabalho para todos, tem tudo para todo mundo. O problema é que tem pessoas que querem tirar até a terra do outro, o alimento do outro e, até mesmo, o direito do outro de existir. Eu acho que cada um pode ser de um jeito e todos viverem em paz. Aprender a ter respeito às diferenças. Muitas coisas são ditas e feitas em nome de Deus, mas Ele não tem nada haver com isso” - enfatizou o músico.

Uma trajetória de sucesso

Da infância em Volta Redonda quando deu os primeiros passos na música até o momento que se formou em canto lírico pela UFRJ, André revela uma trajetória determinada por alguém que decidiu desde muito cedo o que desejava ser quando crescer: músico. Das épocas de criança ele relembra os estudos, o barulho desafinado do trompete, repetido muitas vezes, dia após dia tentando fazer um som afinado. “ Meus pais nunca se incomodaram com o barulho do instrumento, mas os primeiros sons são desagradáveis. Até hoje quando estou estudando fico testando várias possibilidades da minha voz, e às vezes, para quem está ouvindo não é agradável. O que interessa mesmo às pessoas é o resultado que você vai oferecer na apresentação.” relembrou o artista.

Empolgado com as novidades musicais apresentadas por uma amiga e já em idade de cursar a universidade, não pensou duas vezes e matriculou-se no curso de música. “Da informação de uma amiga foi a primeira vez que descobri a UFRJ, e nessa época eu tinha parado de tocar porque o meu pai havia descoberto a minha sexualidade, então, eu estava depressivo. E quando a minha amiga chegou com aquela notícia, eu pensei: essa é a minha oportunidade. Todos os meus problemas estavam resolvidos. Eu iria mudar de cidade, não estava sendo bem aceito, iria começar uma nova vida, queria ser livre, e iria estudar a música que era tudo que sempre sonhei. Eu estudava todos os dias 6 horas por dia.” contou o então aspirante a músico.

Da chegada à universidade muitas foram as transformações na vida do André, o trompete ficou para trás e o canto passou a ser sua grande paixão e missão de vida. Quando se formou no ano 2019, ao marcar a data do recital, a data foi registrada errada e, André só descobriu ao procurar saber se estava tudo certo. Depois disso, em 2020 a pandemia mudou todo o cenário no mundo inteiro, o que mais uma vez, o impediu de fazer o recital de formação, só vindo a acontecer em 2021. “ Quando retornamos às atividades de maneira remota em 2021, marquei a minha formatura. O meu recital foi o primeiro de abertura pós pandemia. O meu recital teve área de ópera, teve canções alemãs, francesas, música brasileira, um repertório bem melancólico e dramático. Me formei e ganhei nota dez da banca. Foi um dia muito feliz, mas choveu, eu vim de moto, me molhei todo. Cheguei chorando, pois estava todo molhado. Deus colocou várias pessoas para me ajudar e deu tudo certo, pois mesmo tendo acontecido esses problemas eu estudei muito. Então estava muito confiante. A sensação foi que tudo estava maravilhoso. A perfeição não existe. Aquele era o melhor que podia fazer e que eu sabia da minha qualidade como cantor. E naquele momento as pessoas passaram a dizer como minha voz era especial. Foi um dia imensamente feliz- lembrou realizado.